"Tal vez el Edén, como lo quieren por ahí, sea la proyección mitopoyética de los buenos ratos fetales que perviven en el inconsciente. " Así habló Cortázar.

19 enero 2012

Mais perigoso que um peido de camelo‏

Tenho poucos registros de meu avô, nos vimos pouco, morreu quando eu apenas caminhava. Mesmo assim duas expressões que ele dizia ficaram na minha memória. Uma era de um tal Russel e ele a repetia maquinalmente: “O conhecimento deixa de ser um espelho mental do universo para converter-se em um simples instrumento para manipular a matéria”. A outra era dele e parecia proferida desde o fundo dos seus sentimentos: “Mais perigoso que peido de camelo”. Ambas as frases fui recordando ao largo dos anos sem entendê-las, mas respeitando-as por algum motivo, talvez por serem o curto legado que meu avô me deixou.  A frase de Russel me vinha à mente toda vez que via um quadro que havia em casa, junto a uma excelente e desmantelada biblioteca. O quadro representava uma imagem de Einstein, que com sua melhor cara de pinguço custodiava a frase: “A imaginação é mais importante que o conhecimento”. Enquanto Russel definia o conhecimento, Einstein dava mais importância à imaginação, uma frase me transladava à outra e eu, desconcertado, as contrastava sem chegar a outro resultado que a simples lembrança do meu avô. Da outra frase, a do camelo, eu me lembrava sempre que um peido aparecia em meu universo, sendo próprio ou alheio, e eu imaginava um animal lento e corcunda, lançando flatulências mortais como o fogo que um dragão emana de sua boca.
Um dia, já mais velho, me vi no Egito, na parte mais austral do país, em Assuã. Fiz um trajeto de poucos quilômetros montado em um camelo para visitar a comunidade dos Núbios, lendários e amistosos. Na véspera não pude pensar em outra coisa mais que nos peidos que soltaria o meu camelo e nos seus efeitos, mas uma vez que parei frente a ele para tentar montá-lo, tive que por todo meu medo na altura do bicho e na estreiteza do caminho à frente.  A travessia terminou sem acidentes e, ou foi o camelo que não soltou nenhum peido, ou fui eu que não percebi. Comecei a pensar que aquilo não era mais que uma frase do meu avô que, até onde eu sabia, nunca havia cruzado com esses animais mais que na sua imaginação, e assim a imagem do meu avô se desprestigiava, apesar de que ele mesmo desde a memória se justificava com a frase de Einstein, já que mais importante que havê-los conhecido é que os haja imaginado.
Há alguns dias, graças a um pequeno artigo do jornal ADN acudiram a mim todas essas recordações de um golpe e com elas a reivindicação de meu avô desde onde quer que esteja. O artigo se intitulava: ”Exterminar o camelo como forma de frear as mudanças climáticas”, e ainda que o título por si já fosse explícito, o conteúdo terminava de despejar qualquer dúvida. Começava: “Aos grandes males, drásticos remédios” e logo explicava que as flatulências dos camelos selvagens contribuem ao efeito estufa, que por ano um camelo emite uma tonelada de CO². Mas pelo que parece que estes animais tão daninhos têm os dias contados, ao menos na Austrália, já que a empresa Northwest Carbon planeja matá-los de helicópteros e veículos 4x4, e depois processar sua carne para alimentar animais domésticos e de granja. Eu me lembrei de meu avô, sem dúvida um visionário. Além disso, começaram a ressurgir em minha mente notícias que haviam chegado a meus olhos e ouvidos através dos meios de comunicação sobre a importância do conhecimento, e sobretudo a importância da imaginação daqueles que, manipulando certa informação, nos nutrem de conhecimento deturpado. Me lembrei de uma nota que li em Voltairenet.org, na qual se explica que “Os piratas somalis são pescadores em luta contra o saque ocidental da pesca de arrasto e a descarga de lixo tóxico”. Recomendo a nota, que ilumina muito sobre um tema de que tanto falaram os meios de comunicação ocidentais, desde outro ponto de vista, claro, acudindo à imaginação para deformar a informação, para contaminá-la. Mecanismo idêntico utilizaram os meios ianques com o 11 de setembro: Criar um mito, inventar um inimigo para justificar suas ações. O mesmo fazem os meios espanhóis nestes dias para justificar as agressões policiais e minimizar a ação de um povo indignado.
Talvez seja hora de utilizar a imaginação, nutrí-la de conhecimento e analisar tudo fazendo uso do mais simples de nossos sentidos, o sentido comum. Ou talvez seja hora de eliminar os inimigos que botam em perigo nosso meio, a começar pelos camelos. Claro que isso seria mais perigoso que um peido de camelo, porque em uns anos poderiam nos dizer que a flatulência humana emite mais CO² que um BMW.


Traducción de Juan Nahuel

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